quarta-feira, 21 de maio de 2014

Uma vaia merecida

       




        Existem vaias de todas as formas, cores, tamanhos, movimento e sonoridade. A vaia, por exemplo, que o cantor e compositor Sérgio Ricardo recebeu ao não conseguir agradar ao público ao cantar a música de sua autoria “Beto bom de bola” e que o acompanhou durante toda a apresentação. Inconformado, quebrou o violão que tocava e o arremessou na plateia.

         Caetano e os Mutantes também não escaparam da reação de uma plateia indignada pelo uso de guitarras quando da apresentação da música "É proibido, proibir". Em resposta à multidão enfurecida que lhes deu as costas, Caetano fez um discurso furioso questionando os jovens: "mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder? Isso ocorreu durante os festivais dos anos 67/68 da Música Popular Brasileira produzidos pela TV Record.

         Mas existiram outras vaias pelo mundo afora, algumas surreais, como a do dia em que o nosso astro rei, o Sol foi vaiado e sem censura por inúmeros cearenses que lotavam os bancos da Praça do Ferreira. A Terra do Sol, vaiar o Sol parece até coisa de baiano, não? Pois bem. o Ceará enfrentava uma seca inclemente e por dois dias o céu se apresentava nublado.

         Pois foi justamente naquele dia, numa tarde do dia 30 de janeiro de 1942 que a vaia não foi dirigida para a 2ª Grande Guerra que prosseguia com sua carnificina nos países da Europa e Ásia. Foi para o Astro Rei que surgiu brilhante espantando a chuva tão desejada.

         Mas há vaias, e vaias. A do alcaide queimadense é daquelas que merecem entrar para o Livro dos Records ou o Guinness Book. Não pela sua dimensão; pela quantidade de pessoas a vaiar; pela sonoridade, enfim por nenhuma dessas alternativas que fazem com que determinado infortúnio, como uma vaia, ganhe suas páginas privilegiadas.

         É que essa vaia saiu do coração de um povo sofrido, amargurado e vilipendiado por um prefeito incompetente, prepotente e agressivo e apenado por uma administração considerada como a pior da história política e administrativa do município. Isso, em que pese o prefeito Tarcísio Pedreira pagar a peso de ouro um pedaço de papel em que empresas pilantras premiam aqueles que não têm caráter e se utilizam dos recursos públicos para se promoverem e, o que é pior, de forma tão barata.

         A cada passo que dava entre o meio de campo e a pequena área para cumprir uma exigência dele próprio, o de cobrar um dos três pênaltis (o jogo havia terminado empatado e a disputa era por uma sequência de três penalidades máximas), o alcaide foi se transfigurando.

         Com os primeiros apupos sua tez foi se alternando; com o aumento das vaias das quase 700 pessoas que foram assistir o final do torneio, seu semblante foi mudando e aquele sorriso falso que políticos inescrupulosos costumam oferecer aos eleitores deu lugar a um esgar, ou seja, uma careta disforme e raivosa.

         Por fim, ao colocar a bola na marca o pênalti e com a gritaria chegando ao apogeu e todos a gritar "vai perder", "vai perder" uma "baba" embranquecida saia discretamente pelo canto esquerdo de sua boca. Ali, naquele momento, com mãos trêmulas e as pernas bambas de ódio, ele percebeu o desastre.

         Mas era tarde para voltar atrás. Não ele, o todo poderoso filho de "Mainha", a execrável, nas palavras de se tio, o ex-prefeito José Mauro de Oliveira Filho, irmão de sua genitora. Correu desajeitado, enfraquecido e zonzo pelas vaias que sabia serem exclusivamente para o seu reinado desastroso e chutou nas mãos do goleiro adversário.


         Guardou suas lágrimas para o colo de "Mainha" e partiu sem que ninguém o percebesse. Melhor assim. Pior, se de punho erguido, xingasse a todos, indistintamente e os desafiasse como é do seu feitio quando acompanhado de sua gangue. Mal sabia ele que, naquele didático domingo o Sobrenatural do Almeida (o Coveiro do Fluminense do Rio), e personagem mítico de Nelson Rodrigues resolveu baixar no Povoado Lage e provocar derrota tão catastrófica, política e futebolística.

Nenhum comentário:

Postar um comentário