Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
A oposição entrou na campanha presidencial com uma questão intrigante: será possível arrancar alguns votinhos de Dilma Rousseff procurando associar a presidenta ao desempenho da Seleção na Copa?
Será que assim seria possível diminuir o prestígio alcançado pelo sucesso do governo na organização da Copa que não ia ter?
A estratégia consiste em lembrar que, há um ano, Dilma disse que seu governo seguia o padrão Felipão. Foi um atalho fácil para responder a quem pedia governo padrão-FIFA. A lembrança é tentadora, salvo por um detalhe: na mesma época, Aécio esgotou um dicionário de adjetivos para falar bem do treinador, que acaba de ser demitido do posto.
A pergunta sobre Dilma atravessou artigos variados no fim de semana. Recém instalada em sua tribuna na Folha de S. Paulo, onde passará os próximos meses da campanha presidencial, a economista tucana Elena Landau acaba de dar sua contribuição ao debate.
Diretora do Banco Central nos tempos de Fernandisdo Henrique Cardoso, Elena Landau lembra a frase de Dilma. Claro que o Felipão do ano passado não era o de hoje, que foi demitido no fim da Copa. Era o técnico que venceu a Copa das Confederações.
Vamos admitir que essa razão não só contribuiu para as palavras da presidente - mas também para os elogios rasgados de Aécio.
Procurando unir a derrota da seleção na Copa ao desempenho de um governo que seria mais produtivo confrontar com ideias e projetos, Elena Landau escreve:
“Nesse momento, é inevitável lembrar uma frase da presidente Dilma: "Meu governo é padrão Felipão". De fato. Em tudo se assemelha a ele. Diante de todas as evidências de que o modelo econômico não está funcionando, o governo insiste na mesma trajetória e aprofunda os erros. De forma arrogante, a presidente chama os que dela discordam de pessimistas - "eles" -, enquanto "nós" sabemos o que é bom para a sociedade. Seu distanciamento da realidade e do eleitor também lembra a CBF. Isolada em seu castelo, diz que vai tudo muito bem e nada precisa ser revisto.”
O problema é que, em 8/7/2013 Aécio publicou um artigo - no mesmo espaço na mesma página no mesmo dia da semana que a economista agora ocupa - onde sugeria que Felipão era técnico era tão bom, tão competente, tão capaz, que a presidente sequer tinha o direito de comparar qualquer traço de seu governo com ele. O candidato tucano chegou a sustentar que o técnico tem um padrão que poderia ser de utilidade para a administração pública - aquela que está em campanha para assumir nas eleições de outubro.
Olha só o que Aécio escreveu:
“A presidente Dilma Rousseff cometeu enorme injustiça com o técnico Luiz Felipe Scolari ao dizer que seu governo tem um "padrão Felipão". Foi uma comparação infeliz, já que em nada os "times" se assemelham. A primeira grande diferença é que Felipão convocaria os melhores, e não os mais próximos ou os mais amigos.
Por tudo que os brasileiros conhecem dele, sabem que não toleraria qualquer tipo de privilégio. Transparente como é, seria intransigente com os desvios, a má conduta e a corrupção. Corajoso, jamais jogaria só para a torcida, evitando decisões às vezes difíceis e impopulares, mas necessárias.
Onde o treinador está a sua liderança se estabelece naturalmente pelo respeito e competência. Suas firmes convicções nunca o impediram de aceitar críticas e reconhecer erros quando eles ocorrem.”
Descobrindo até insuspeitas virtudes de caráter políticos do técnico do time que seria vencido por 7 a 1 em Belo Horizonte e por 3 a 0 em Brasília, Aécio ainda acrescentou:
“(Felipão) Aprendeu a acolher o sentimento nacional do que se convencionou chamar, simbolicamente, de pátria de chuteiras, que jamais imaginou dividir em duas. Não ignora o que gritam as arquibancadas. Sabe, como poucos, canalizar a energia da massa em favor do seu time para a superação de grandes desafios.”
Não é só. Empolgadíssimo, mais adiante Aécio defende a ideia de que Felipão seria um ótimo exemplo como gestor público. Leiam:
“Se introduzido como paradigma para administração pública, o padrão Felipão mudaria importantes prioridades do governo. Logo de início, certamente armaria uma defesa intransponível contra a inflação.
Seus volantes marcariam a corrupção sob pressão. A articulação do meio-campo se daria sob o regime de alta transparência e solidariedade de esforços. No ataque, a criatividade e o talento brasileiros ganhariam espaço e estímulo para aplicar goleadas nos nossos verdadeiros inimigos - a desigualdade, a ignorância, a violência, a injustiça e o baixo crescimento.
Com um padrão Felipão correríamos dez vezes mais, de forma organizada, perseguindo objetivos claros. A leniência estaria fadada ao banco de reservas, a incompetência levaria cartão vermelho assim que entrasse em campo, e o improviso não provocaria vaias nos estádios lotados.
O estilo Scolari não canta vitória antes da hora, não permite salto alto e nem desrespeito ao oponente. Entende adversários como adversários, nunca como inimigos, e é capaz inclusive de reconhecer méritos neles. É duro, mas leal e verdadeiro. Sofre cada segundo enquanto seus jogadores se matam em campo pelo melhor resultado. Quando perde - e às vezes perde -, é o primeiro a assumir suas responsabilidades. Não a transfere nem terceiriza e sempre acrescenta algum aprendizado.
Exemplos como o do técnico são preciosos quando ultrapassam a fronteira do utilitarismo e da apropriação indevida e incorporam valores como qualidade, espírito de equipe e convergência em torno de causas comuns. Sem esquecer o mais importante: o Brasil em primeiro lugar.”
Você lê o texto e fica com a impressão de que o jeito do " precioso" Felipão, seu estilo, suas ideias, são uma síntese do programa de governo do PSDB. Vamos examinar alguns trechos mais de perto. Prioridade no discurso tucano, Felipão poderia ajudar na luta contra a inflação. Seu estilo - reconhecidamente autoritário - não divide o país. Imaginando Felipão na administração pública, Aécio diz acreditar que ele "mudaria importantes prioridades do governo."
Com essas palavras, Felipão, nem é mais um técnico de futebol. Não é elogiado por seu "padrão," seja lá o que for isso. É um estadista!
O que isso mostra?
Em primeiro lugar, o óbvio: é sempre bom conhecer o próprio candidato antes de sair por aí criticando os adversários. Em caso de dificuldade, uma pesquisinha básica no Google ajuda muito. Em segundo lugar, é claro que futebol pode trazer alegrias e tristezas - mas é preciso ter muita sabedoria para entender o que ele tem a ensinar sobre a política - e vice-versa. Em terceiro lugar: uma boa campanha eleitoral se faz com ideias - e não com truques elementares para confundir os eleitores.
Depois de passar oito anos criticando as metáforas futebolísticas de Luiz Inácio Lula da Silva, a oposição tenta o mesmo caminho. Mas há muito para aprender, concorda?
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